Roberto Abraham Scaruffi: UM CERTO HOMEM

Friday, 15 July 2011

UM CERTO HOMEM


UM CERTO HOMEM
Um homem, seu cavalo e seu cão, caminhavam por uma estrada.
Depois de muito caminhar, esse homem se deu conta de que ele,
seu cavalo e seu cão haviam morrido num acidente.
Às vezes, os mortos levam tempo para se dar conta de sua nova
condição. A caminhada era muito longa, morro acima, o sol era
forte e eles ficaram suados e com muita sede. Precisavam desesperadamente
de água.
Numa curva do caminho, avistaram um portão magnífico, todo
de mármore, que conduzia à uma praça calçada com blocos de ouro
no centro, da qual havia uma fonte de onde jorrava água cristalina.
O caminhante dirigiu-se ao homem que numa guarita, guardava
a entrada.
– Bom dia, ele disse.
– Bom dia, respondeu o homem.
– Que lugar é este, tão lindo?, ele perguntou.
– Isto aqui é o céu, foi a resposta.
– Que bom que nós chegamos ao céu, estamos com muita sede,
disse o homem.
– O senhor pode entrar e beber água à vontade, disse o guarda,
indicando-lhe a fonte.
– Meu cavalo e meu cachorro também estão com sede.
– Lamento muito, disse o guarda. Aqui não se permite a entrada
de animais.
O homem ficou muito desapontado porque sua sede era grande.
Mas, ele não beberia, deixando seus amigos com sede. Assim,
prosseguiu seu caminho.
Depois de muito caminharem morro acima, com sede e cansaço
multiplicados, eles chegaram a um sítio, cuja entrada era marcada
por uma porteira velha semi-aberta.
A porteira se abria para um caminho de terra, com árvores dos
dois lados que lhe faziam sombra. À sombra de uma das árvores, um
homem estava deitado, cabeça coberta com um chapéu, parecia que
estava dormindo:
– Bom dia, disse o caminhante.
– Bom dia, disse o homem.

– Estamos com muita sede, eu, meu cavalo e meu cachorro.
– Há uma fonte naquelas pedras, disse o homem e indicando o
lugar. Podem beber a vontade.
O homem, o cavalo e o cachorro foram até a fonte e mataram a
sede.
– Muito obrigado, ele disse ao sair.
– Voltem quando quiserem, respondeu o homem.
– A propósito, disse o caminhante, qual é o nome deste lugar?
– Céu, respondeu o homem.
– Céu? Mas, um homem em uma guarita, ao lado de um portão
de mármore, alguns quilômetros abaixo, disse que lá era o céu!
– Aquilo não é o céu, aquilo é o inferno.
O caminhante ficou perplexo.
– Mas então, disse ele, essa informação falsa deve causar grandes
confusões.
– De forma alguma, respondeu o homem. Na verdade, eles nos
fazem um grande favor. Porque lá ficam aqueles que são capazes de
abandonar até seus melhores amigos.